Negligenciar
matemática prejudica saúde, emprego e vida em geral
É comum pensar que
matemática não serve para nada, e que tudo aquilo que aprendemos na
escola é uma perda de tempo. No entanto, não ter habilidades
matemáticas é uma má notícia para a nossa carreira, escolhas de
vida e até mesmo para nossa saúde mental.
Muitos estudantes
têm verdadeiro medo de matemática, um sentimento impulsionado por
uma cultura que está constantemente tentando nos convencer de que
ela é difícil e inútil.
No entanto, o tempo
passa e nossas vidas pessoais e profissionais tornam-se cada vez mais
dependentes da nossa capacidade de compreender e processar números,
que hoje simplesmente não é boa.
A numeracia que
poucos têm, ou a matemática que é pouco ensinada
Alfabetização
matemática não implica proficiência em algumas das áreas mais
avançadas de matemática, como cálculo ou trigonometria. Em vez
disso, descreve o conhecimento e as habilidades necessárias para
gerenciar com eficácia as demandas matemáticas de diversas
situações.
É a capacidade de
um indivíduo de identificar e compreender o papel que a matemática
desempenha no mundo, fazendo julgamentos bem fundamentados e usando a
matemática de forma que atenda às suas necessidades como um cidadão
construtivo, preocupado e reflexivo.
Alfabetização
em matemática, portanto, é menos sobre as habilidades com equações
complexas e mais sobre a capacidade de realizar operações mecânicas
com números e símbolos.
Numeracia também
pode envolver o que o matemático Sol Garfunkel chama de
“alfabetização quantitativa”, a habilidade de fazer conexões
quantitativas sempre que a vida exige (como ser confrontado com
resultados de testes médicos conflitantes, e precisar decidir se
submeter a um ou outro procedimento) e “modelagem matemática”,
ou a capacidade de resolver na prática problemas cotidianos e
formulações matemáticas (como decidir se é melhor comprar ou
alugar uma casa).
Necessidade
gritante
A nossa necessidade
de matemática nunca foi tão grande. Cada vez mais tem uma
influência pronunciada sobre nossas escolhas fiscais e até mesmo
sobre nosso risco no que tange à saúde. Tem até sido associada com
uma susceptibilidade reduzida ao efeito de enquadramento (um viés
cognitivo no qual as pessoas reagem às opções dependendo se elas
são ou não apresentadas de uma forma positiva ou negativa), a
tendência de escolha lógica sobre a emoção, e uma maior
consciência dos riscos que têm um componente numérico envolvido.
Tão importante
quanto isso, a numeracia também tem um impacto significativo em
nossas carreiras. Tendo em conta que o mundo está se movendo em
direção a uma economia baseada no conhecimento, a falta de
habilidade matemática é uma grande preocupação que afeta não só
nossas oportunidades, mas também nossa capacidade de avaliar
criticamente as informações a nós apresentadas, tirando nossas
próprias conclusões, ao invés de alguém ter que nos dizer o que
elas significam.
De fato, muitas
profissões exigem pelo menos um senso rudimentar de matemática,
incluindo contabilidade, análise de risco, finanças, engenharia,
arquitetura, ciências sociais, planejamento urbano e outras,
incluindo trabalhos fora das áreas especializadas.
Não saber
matemática reduz as chances de emprego e promoções, resultando em
carreiras não qualificadas, empregos de baixa remuneração e
desemprego.
De acordo com a
pesquisa PISA, a proficiência em matemática é um forte preditor de
resultados positivos para jovens adultos, que influencia seus ganhos
futuros. As competências de base em matemática têm um grande
impacto sobre as oportunidades de vida dos indivíduos, aumentando o
acesso das pessoas a empregos melhor remunerados e mais
gratificantes, além de estarem intimamente relacionadas à forma
como a riqueza é compartilhada dentro das nações.
Além disso, a
pesquisa mostra que as pessoas com fortes habilidades em matemática
também são mais propensas a se voluntariar, se veem mais como
atores e não como objetos de processos políticos e são mais
propensas a confiar nos outros. Justiça, integridade e inclusão nas
políticas públicas, portanto, também dependem das competências
matemáticas dos cidadãos.
Solução
simples
Taxas de numeracia
baixas e até mesmo a relutância em se concentrar em áreas mais
avançadas de matemática são, em grande parte, a consequência de
uma cultura antimatemática. Não é raro ouvir os alunos
queixarem-se de quão chata, difícil ou inútil ela é. Claramente,
essa cultura tem que mudar.
Mas, para isso,
também que temos que levar a conta a ansiedade que a matemática
produz, uma condição real com consequências para a saúde mental.
Ansiedade matemática
é um sentimento de tensão, apreensão ou medo que interfere com o
desempenho de matemática das pessoas. Pesquisas já mostraram que os
indivíduos com ansiedade matemática têm pior memória de trabalho,
o que é provavelmente causado por uma interrupção de processos
centrais no cérebro.
Além disso,
ansiedade matemática é mais sobre a antecipação de fazer contas
do que sobre fazer contas. Só de pensar nisso, o cérebro de uma
pessoa pode mostrar os mesmos sinais
do
que quando ela está sentindo dor.
Então, como aliviar
a ansiedade matemática? E como podemos deixar de lado a cultura
antimatemática predominante?
Tudo se resume à
qualidade da educação e como a matemática é apresentada, diz
Garfunkel.
Diferentes conjuntos
de habilidades matemáticas são úteis para diferentes carreiras, e
a educação matemática tem que refletir isso.
Por exemplo,
quantas vezes a maioria dos adultos se encontrou uma situação em
que eles precisaram resolver uma equação quadrática? Será que
eles precisam saber o que é um número complexo?
Claro, matemáticos,
físicos e engenheiros profissionais precisam saber de tudo isso, mas
a maioria dos cidadãos tiraria melhor proveito do estudo de
hipotecas, programação de computadores e leitura de resultados
estatísticos de um ensaio clínico, para citar alguns exemplos.
Um currículo de
matemática que incida sobre os problemas da vida real exporia os
alunos a ferramentas abstratas de matemática, especialmente a
manipulação de quantidades desconhecidas, mas não focaria somente
no ensino da matemática “pura”, sem contexto, e sim ensinaria
problemas relevantes que levariam os alunos a apreciar a maneira como
um modelo de fórmula matemática esclarece situações do mundo
real.
Outra
mudança positiva seria abolir o uso da misteriosa variável “x”,
que muitos estudantes se esforçam para entender, e passar para uma
abordagem contextual, no estilo que os cientistas trabalham,
introduzindo fórmulas com abreviaturas para quantidades simples,
como a famosa equação de Einstein, “E = mc2”, onde “E”
representa energia, “m” massa e “c” velocidade da luz.
Garfunkel nos pede
para imaginar álgebra, geometria e cálculo sendo substituídos por
coisas como finanças, contabilidade e engenharia básica. Assim, no
curso de finanças, os alunos aprenderiam a usar fórmulas em
planilhas e estudar orçamentos de pessoas, empresas e governos, e no
curso de engenharia básica, aprenderiam o funcionamento de motores,
ondas sonoras, sinais de TV e computadores etc.
O que você acha?
Com certeza, seria uma nova visão da matemática nas escolas, mas
traria, de fato, melhores resultados para a sociedade?